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08/10/2010 14:16:27
.jornal do 10ocelio10

#Jornal do Célio...
#Assunto Reportagem do bau[Nordeste esconde sua Água-Ano
1968]
#NORDESTE ESCONDE
SUA ÁGUA

Nas cidades e no sertão, a água é vendida a 4
centavos a lata. Mas sob o Nordeste correm dois
grandes rios, entre 50 e 350 metros de profundidade

As novas esperanças do Nordeste estão sepultadas, algumas
há milhões de anos, outras há séculos, outras desde a
última chuva. São as águas subterrâneas, que, trazidas à
superfície, vão transformar a sêca numa lembrança. Para
descobrir onde está essa água, a Sudene chamou técnicos
israelenses, Joel Gat, Emanuel Mazor e Abraham Mercado, que
andaram pelo Nordeste durante três semanas. Para saber se
pode usar essa água escondida sob a terra sêca, a Sudene
mandou amostras colhidas pelos israelenses a laboratórios
em Israel, França e Áustria. Dos 15 bilhões de metros
cúbicos anuais de chuva no Nordeste, 90 por cento se
evaporam sob o sol forte do verão, 9 por cento enchem no
inverno os leitos dos rios e riachos e se escoam no mar. Um
por cento se infiltra na terra — estas águas são as novas
esperanças do Nordeste.

Não era petróleo — A água subterrânea sempre foi usada no
Nordeste, sem método, através de um ou outro poço raso, de
capacidade pequena. Seu uso intensivo começou no ano
passado, em Mossoró, no Rio Grande do Norte, quando uma
sonda da Petrobrás achou um lençol de água. Os 100 mil
habitantes da "cidade mais sêca do Brasil" hoje a chamam "a
cidade com água mais quente do mundo": a do lençol chega ás
torneiras a 53 graus. E basta para a cidade durante dez
anos. Mas, das 16 mil casas de Mossoró, apenas 2 mil a
recebem por enquanto; as outras ainda não têm encanamentos
da Companhia de Águas e Esgotos do Nordeste, subsidiária da
Sudene. A maior parte da população, assim, ainda depende,
como há meio século, da água barrenta do rio Mossoró ou da
pouca água de chuva guardada em cisternas. Nas casas onde
há encanamento a água é cara, mas pura. Quem bebe água do
rio Mossoró entra numa lista em tinta vermelha do
Departamento Nacional de Endemias Rurais como portador de
ameba, uma das causas da mortalidade infantil no Nordeste.
Nessa lista estão 80 por cento das crianças de Mossoró.

Ouro do Império — "Enquanto houver ouro no Império, nenhum
nordestino morrerá de sêde", disse Dom Pedro II, durante a
construção do primeiro grande açude do Ceará, no Cedro, na
sêca de 1877. Noventa anos depois, em 245 açudes pequenos,
médios e grandes, o Nordeste guarda 11 bilhões de metros
cúbicos de água, que poderiam irrigar 150.000 hectares de
terras, ou 1.500 quilômetros quadrados. Mas o Departamento
Nacional de Obras contra as Sêcas, antes da fundação da
Sudene em 1959, preocupava-se mais com obras grandiosas,
que dessem empregos e salários aos milhares de
trabalhadores desempregados durante as sêcas. Assim, o
planejamento foi deixado de lado e, até hoje, os canais de
irrigação só beneficiam 11.000 hectares. Mais de um décimo
da água dos açudes não é usado; os cablocos chamam os
açudes de "piscinas do sertão", de onde só se aproveita o
peixe. O IV Plano Diretor da Sudene prevê a aplicação, até
1973, de 421 milhões de cruzeiros novos em dez projetos de
irrigação em Pernambuco, Bahia, Ceará, Sergipe e Alagoas,
mais um projeto do DNOCS em Jacurici, na Bahia. Com tudo
isso, daqui a cinco anos o Nordeste estará irrigando apenas
115.000 dos 150.000 hectares que poderia cultivar já hoje,
com a água que tem, sem mêdo da sêca.
Cidade de Mossoró:
água quente, pura


Céu e mar — "Mesmo que tôda essa água pudesse ser
aproveitada agora", afirma um técnico da Sudene, "o
Nordeste continuaria com baixa renda per capita no campo,
com preços instáveis e níveis submínimos de alimentação".
Por isso o Nordeste continua procurando mais água. Alguns a
procuram no céu, como o catedrático de Bioquímica e diretor
do Instituto de Meteorologia da Universidade do Ceará, o
médico João Ramos da Costa. Outros a procuram no mar, como
o professor de Geografia Nélson de Oliveira, do Colégio da
Bahia. Diz o Professor Costa: "Nuvens negras, que no Sul
indicariam chuva certa dentro de poucos minutos, no
Nordeste só passam. Nelas há instabilidade entre os
cristais sólidos, as gotículas líquidas e o vapor gasoso".
Ao bombardear êsses "sistemas instáveis" com gêlo sêco ou
sal de cozinha, o Professor Costa tem conseguido fazer
chover. Para o Professor Oliveira, a solução é abrir largos
e longos canais que tragam a água do mar para dentro da
terra. "Há plantas que se dão bem junto à água salgada,
como a banana", conclui o Professor Oliveira.

Terra e água — Mas a Sudene não acredita no céu e no mar e
sim na terra. No sertão do Nordeste a terra é dura: são
rochas cristalinas, em que a água não penetra. Mas nos
leitos dos rios há rachas por onde a água, há milhões de
anos, foi descendo até encontrar grandes espaços ocos no
meio das rochas e acumular-se em bolsões, a partir de 900
metros de profundidade. Sob as terras mais próximas do
litoral e na Bacia potiguar, por onde correm os rios do Rio
Grande do Norte, há dois grandes rios subterrâneos, entre
50 e 350 metros de profundidade, num total de 200 bilhões
de metros cúbicos de água. Nessa região a terra é
sedimentar, mais mole, e a água de chuva se infiltra com
facilidade: os dois rios subterrâneos recebem 165 milhões
de metros cúbicos por ano, tanto quanto perdem ao escoar no
mar. No sertão há menos água subterrânea e mais água
salgada, mesmo na superfície, do que no litoral. No Curu,
no Ceará, os canais de irrigação feitos na década de 30 sem
análise da água tornaram a terra imprestável. "Até hoje,
por causa da água salgada, não cresce um pé de couve",
afirma o Secretário da Viação do Ceará, Fernando Mota. Mas
a água subterrânea do sertão que fôr julgada aproveitável
será bem-vinda numa região em que até hoje a água é vendida
em latas de querosene.

O preço da lata — Entre Mossoró, na área sedimentar, e
Patos da Paraíba, na região cristalina, há 300 quilômetros
de caatinga, rios secos, gado magro, alguns açudes, um
habitante por quilômetro quadrado, algumas galinhas e
alguns cachorros em tôrno das casas de adôbe, crianças
pálidas e barrigudas, muito sol, calor forte e pouca água.
O Prefeito José Cavalcanti calcula que Patos tenha 60 mil
habitantes; é a terceira cidade da Paraíba, depois de
Campina Grande e João Pessoa. Dois caminhões-tanques da
Prefeitura, fazem o dia inteiro o trajeto caixas d’água —
vilas, onde não há encanamento. Particulares compram água
nos poços, enchem caminhões e revendem nos bairros. Cada
caminhão serve de cada vez quinhentas pessoas, que têm
direito a três latas de querosene cheias de água, a 4
centavos a lata. Quem não paga no fim da semana, não recebe
mais água. A grande piscina do Hotel JK, construído em
1962, nunca tem água. Para enchê-la, tôda uma vila da
cidade, 5 ou 6 mil pessoas, ficaria sem água uma semana.
Sob a região de Patos, como em todo o Nordeste, há mais
água, como descobriram com radiosótopos os técnicos de
Israel, que daqui a alguns meses entregarão à Sudene um
relatório sôbre sua localização e sôbre os melhores métodos
de arrancá-la do fundo da terra.

Água no Sul — Em Mossoró, Josias Ribeiro, com duas lojas de
calçados e seis netas na sua casa com água encanada, cobra
10 centavos por lata de água que sobra de sua cota
mensal. "Sempre ajuda para inteirar a taxa de 9 contos",
explica. Na serra de Borborema, entre Patos e Campina
Grande, Maria da Conceição, 45 anos e 40 quilos, anda todo
dia 2 quilômetros com lata de água na cabeça, comprada na
vila de Santa Luzia. Com seu marido, Raimundo, planta
algodão nas encostas, a trôco de metade da colheita. Seu
filho também Raimundo, atira de carabina nas aves que
tentam beber água. Maria da Conceição, na casa de chão de
terra batida, com uma máquina de costura velha e
enferrujada, tem uma esperança: "O filho um dia cria
coragem e, se Deus quiser, vai para o Sul, beber água boa".
Laboratório de análise
de água: se tiver muito
sal, não serve para plantas
Foto: Amilton Vieira

O nôvo Nordeste — José Júlio Rosental, 35 anos, coordenador
do Projeto de Aplicação de Radioisótopos na Indústria, da
Comissão Nacional de Energia Nuclear, no Rio de Janeiro,
foi um dos dez técnicos brasileiros que acompanharam os
israelenses em 2.000 quilômetros de caatinga. E
conta: "Homens vegetam, comendo farinha e cacto. São
doentes corajosos e conformados. Mas a ciência trará mais
água, mais irrigação, mais empregos". Com êle viajaram
Enéias Salati, trinta anos, e Admar Cervellini, professôres
de Física da Escola Superior de Agricultura Luís de
Queirós, em Piracicaba, São Paulo. Êles corcordam: "Com
esfôrço, dentro de cinco anos estaremos no mesmo pé de
Israel, colhendo em terra sêca há séculos". Outro
acompanhante dos israelenses, o Professôr Carlo Maestrini,
do Instituto de Pesquisas Radiativas de Belo Horizonte;
conclui: "O Brasil produz, em São Paulo e Minas, os
radioisótopos de que o Nordeste precisa para achar sua água
subterrânea. Os laboratórios em breve nos dirão como essa
água precisa ser tratada para ficar boa".
Como descobrir água com radioisótopo

Para descobrir por onde correm as águas subterrâneas do
Nordeste, os técnicos israelenses usaram radioisótopos, sem
precisar cavar buracos nem abrir poços. Cada um dos 102
elementos químicos da natureza, como o oxigênio, o carbono,
o ferro, são constituídos de átomos exatamente iguais uns
aos outros: a característica do átomo é que determina o
elemento. Nesses rebanhos de átomos iguais, porém, há
algumas ovelhas negras: os isótopos, átomos iguais aos
outros em tudo, apenas ligeiramente mais pesados, por terem
mais nêutrons em seu interior. Alguns dêsses isótomos são
radioisótopos, isto é, tornam-se radiativos ao receber uma
carga de radiação suficientemente pequena para não causar
nenhum mal ao homem e suficientemente grande para serem
detectados por contadores Geiger, medidores de radiação.
Injetando radioisótopo, seja no sangue dos doentes, nos
lençóis de água ou nos minerais que alimentam plantas, é
possível descobrir onde vão parar o sangue (numa obstrução
circulatória), a água (acompanhada por técnicos que andam
pela superfície com os contadores Geiger) e o míneral na
planta (se nas fôlhas, no caule, etc.). O Brasil produz
radioisótopos de fósforo e carbono; precisa de reatores
nucleares para produzir radioisótopos de outros elementos.

Idade e sal — Os técnicos insraelenses recomendaram, para
determinar a idade das águas subterrâneas, além da técnica
do carbono-14, que alcança até 30 mil anos, com margem de
êrro de cêrca de um século, a técnica do trítio, que pode
dar idade exata da água de trinta anos para cá. A técnica
do carbono-14 baseia-se em que tôda matéria vai perdendo
energia, atráves da radiação, desde que foi formada; assim,
calculando-se a perda de energia, é possivel determinar a
época da formação da matéria. O trítio, elemento muito raro
na natureza, tem sido liberado pelas explosões atômicas; se
a água contiver trítio, é que provém de chuva posterior à
bomba atômica. A água mais nova deve ter menos sal do que a
mais velha e é mais fácil usá-la na agricultura. Outra
técnica nuclear ajudará: a análise dos isótopos de
hidrôgenio e oxigênio que a compõem. Conforme a proporção
entre isótopos e átomos em cada um dos dois elementos é
possível esperar mais ou menos sal na água.
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08/10/2010 14:18:31
.jornal do 10ocelio10.


#Jornal do Célio...
#Assunto Medicina[Sentido da morte]
#

O TRÁGICO E HUMANO
SENTIDO DA MORTE

"Nunca supus que isso a que chamam morte tivesse qualquer
espécie de sentido." Para o poeta português Fernando
Pessoa, não havia significado algum no fim da vida do amigo
que êle chorava com êsses versos.

No último dia 2, pouco antes da meia-noite, a morte do
suicida Aggeu Alves, promotor em São Vicente, São Paulo,
significava esperança de vida para quatro doente — um do
coração, dois do rim e um do pâncreas. E para a equipe de
57 médicos, 26 enfermeiras e dezenas de atendentes, a morte
de Aggeu significava também o início de uma das maiores
operações de transplante já realizadas em todo o mundo.

Um paciente comum — Quando chegou ao Centro Cirúrgico do
Hospital das Clínicas de São Paulo, com a cabeça perfurada
por uma bala calibre 45, Aggeu Alves era um paciente
qualquer. Respirava mal, embora tivesse o pulso e a pressão
normais. O médico de plantão que o atende, percebe logo que
êle tem poucas possibilidades de vida. O tiro, por êle
mesmo disparado, entrou pelo lado direito da cabeça,
abrindo um grande orifício junto à têmpora. A bala saiu do
outro lado, mais no alto. Para facilitar sua respiração,
uma sonda é introduzida em sua bôca até a traquéia. Para
compensar a perda de sangue, parte dêle é reposto através
de uma veia. É levantada a hipótese de uma cirurgia
cerebral. Um neurocirurgião consultado afasta a
possibilidade: "Inútil, é um caso perdido".

A autorização — Pouco depois do meio-dia, o chefe do Pronto
Socorro telefona para o Dr. Euryclides de Jesus Zerbini,
chefe da equipe de transplante: avisa que há um possível
doador. Zerbini chega ao hospital e examina o paciente. O
tipo de sangue é favorável. Mas é preciso obter a
autorização da espôsa de Aggeu Alves para o transplante. O
chefe do Pronto Socorro, dirigindo-se ao Dr. Zerbini: "Você
fala com a mulher?" O Dr. Zerbini, meio encabulado: "Sabe,
eu não tenho muito jeito para êsse negócio, não. Acho
melhor a gente chamar Dona Clarice."

Dona Clarice é a enfermeira-chefe do Hospital das Clínicas.
Ela conversa com a mulher do promotor. Na sala do diretor
administrativo do Hospital, a autorização é dada por
escrito.

Luta pela vida — Os médicos continuam lutando pela vida de
Aggeu Alves, o homem cuja morte pode salvar quatro pessoas,
já preparadas para a cirurgia em salas vizinhas. Aggeu não
tem mais reflexos, sinal de que algumas partes do cérebro
já deixaram de funcionar. Mas continua recebendo sôro e
sangue e seus pulmões funcionam artificialmente, forçados
por um pequeno aparelho. O coração bate.

O tempo passa. O corpo de Aggeu Alves é submetido a
radiografias do tórax, para verificar o tamanho do coração
e a presença de eventuais doenças cardíacas. Confirma-se: é
um bom doador. Mas é preciso mantê-lo vivo. Êle recebeu 2
litros de sangue e continua sangrando muito pela cabeça.
Não há como estancar a hemorragia. Dois neurocirurgiões
tentam por todos os meios, não conseguem. Já há algum tempo
as equipes de transplante estão sendo chamadas: todos os
seus integrantes levam no bôlso do avental pequenos
aparelhos receptores que recebem sinais da central de
comunicações. Um bip-bip é o sinal para convocá-los.

Morto e o coração bate — Os médicos não acreditam mais que
Aggeu Alves possa viver. Êle é levado para a sala B do
Centro Cirúrgico, a sala do doador. O eletrocardiógrafo é
ligado aos pulsos, aos pés e ao tórax: as pulsações
cardíacas aparecem numa tela. O barbeiro raspa a cabeça do
promotor. Nela são aplicados de dez a doze terminais do
eletroencefalógrafo, aparelho que mede a atividade
cerebral. O resultado são oito linhas numa tela, cada uma
delas mostrando a vida de determinada região do cérebro.
Quando alguma linha não apresenta nenhuma sinuosidade,
indica que a parte do cérebro a que ela corresponde deixou
de funcionar.

As oito linhas do cérebro do doador estão retas. O cérebro
do promotor está morto.

Que dúvidas ainda poderiam existir sôbre a morte total? Uma
espécie de flash é aceso várias vêzes à frente de seus
olhos: nenhuma reação. Um aparelho que emite sons muito
graves e muito agudos é ligado junto a seus ouvidos:
nenhuma reação. O corpo de Aggeu Alves é espetado com
estiletes, beliscado: nenhuma reação. Aggeu Alves está
morto. Mas seu coração ainda bate.

O teste final: o corpo do doador é desligado da respiração
artificial durante cinco minutos e não volta a respirar
naturalmente.

São quase dezoito horas: pode-se começar o transplante.

Parem o transplante — De repente o diretor administrativo
do Hospital ordena que o transplante seja interrompido: um
irmão e uma cunhada de Aggeu Alves se opõem à doação. No
Centro Cirúrgico, o corpo do promotor está outra vez
recebendo respiração artificial. Mais um pouco de demora e
todo o trabalho feito para o transplante estará perdido. O
impasse se prolonga. Os próprios médicos decidem descer
para conversar com o irmão do doador. O Professor Zerbini
usa um argumento dramático: "Aggeu Alves já morreu, meu
senhor. Mas mesmo assim ainda pode contribuir para salvar
as vidas de quatro pessoas".

As linhas mortas — Nove e meia da noite. O
eletroencefalograma continua registrando as linhas mortas
do cérebro de Aggeu Alves. O problema não foi resolvido,
mas o coração ainda bate. O irmão argumenta: "O que vão
pensar os outros parentes?" Um médico explica que entre
êste tipo de operação e a autópsia pela qual o corpo tem de
passar normalmente, a diferença é quase nenhuma.

O Doutor Zerbini usa seu último argumento: "Não pense o
senhor que somos nós que estamos forçando a operação. São
quatro pessoas que esperam, e que precisam viver. O senhor
quer falar com elas?" Os argumentos dos médicos convencem
os parentes. Nova autorização é assinada na diretoria do
hospital. Cada médico volta ao seu lugar. Começam os
preparativos finais. Faltam dez minutos para a meia-noite.
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08/10/2010 14:19:29
jornal do 10ocelio10....

#Jornal do Célio...
#Assunto Os caminho da Igreja na America Latina

#UMA NOVA MISSÃO

Os bispos progressistas queriam uma Igreja
com a missão obrigatória de participar da luta pelo
progresso material da América Latina.
Conseguiram a adesão dos indecisos e venceram.
A CELAM, vista pelo enviado Fernando Semedo

Quase trezentos bispos passaram duas semanas em Medellin
discutindo os caminhos da Igreja na América Latina. Dom
Antônio Samore, no centro, foto acima, representou o Papa.
Diz que o Vaticano acatará as decisões
da CELAM

O padre mostrava "slides" coloridos e gráficos com muitos
números: a América Latina tinha 200 milhões de habitantes
em 1960, hoje tem 264 milhões e no fim dêste século deverá
alcançar 638 milhões. A renda per capita na América Latina
está perto dos 350 dólares anuais — NCr$ 1.267,00. Apenas
cinco países no continente todo têm índice de analfabetismo
inferior a 20% e três outros chegam a ter mais de 60%. Em
1965, 51% da população em idade escolar freqüentava escolas
e uma projeção bastante otimista mostra que são necessários
pelo menos doze anos para chegar a 98%. A expansão
demográfica não corresponde a um aumento no númento dos
padres: há cada vez menos padres e cada vez mais fiéis. O
número de habitantes por paróquia urbana, por exemplo, já
ultrapassou os 18 mil e continua crescendo verticalmente.
No auditório, quase trezentos católicos de tôda a América
Latina, os participantes da II Conferência do Conselho
Episcopal Latino-Americano, viram e ouviram tudo com
atenção. Depois passaram duas semanas dentro do seminário
maior de Medellin, Côlombia, discutindo dia e noite para
pôr a limpo omissões e culpas do passado e traçar em planos
a responsabilidade que a Igreja Católica assume no trabalho
de transformar a América Latina.

Os três grupos — No comêço ainda era possível distinguir
três tipos de participantes. Uma minoria que não sabia bem
porque estava lá, não via meios nem acreditava na
conveniência de a Igreja se comprometer com a mudança de
uma realidade pouco animadora. Outra minoria — a "minoria
de Abraão", como a chama Dom Helder Camara — cheia de
idéias, disposta a discutir e a mostrar que êsse
compromisso é missão obrigatória de quem se considera parte
do povo de Deus. E uma maioria indecisa, insatisfeita com a
realidade, receptiva ao diálogo, mas sem saber precisamente
como assumir êsse compromisso. Ao longo das duas semanas,
a "minoria de Abraão" comandou o grande grupo dos indecisos
e, juntos, atenderam a pelo menos uma das recomendações que
o Papa lhes havia feito em Bogotá: a de "virar uma página
da História da Igreja latino-americana". "Não esperem os
milagres", disse Dom Avelar Brandão, brasileiro, bispo de
Teresina, um dos três presidentes da Conferência, no dia do
seu encerramento. "Para que tudo isso se efetive, é preciso
uma mobilização geral de todo o povo cristão, dentro e fora
da Igreja. Todos têm de ser sensibilizados pela ideologia
dos documentos finais da Conferência, para salvação dos
povos da América Latina."

O povo e seus pastôres — Êsses documentos foram elaborados
por dezesseis comissões e resumidos num único que será
entregue ao Papa. Uma declaração final, feita pelo Cardeal
Antônio Samore, representante de Paulo VI, não convenceu
muita gente de que seu autor leve nos documentos aprovados
a "prudência" que parecia desejar. A sua preocupação com o
rumo das posições assumidas pelo episcopado chegou a ser
confessada por alguns bispos durante a Conferência. E
tampouco lhes devem ter agradado os aplausos recebidos por
D. José Pires, bispo negro de João Pessoa, quando êste
pediu em plenário que todos pensassem principalmente no
povo de que são pastôres, "sem mêdo do que Roma possa
pensar sôbre as nossas decisões". A própria autorização
para publicação imediata dos documentos — embora êles só
ganhem a categoria de oficiais após o exame papal — foi
vista como mais um fruto do trabalho dos progressistas.
Samore declarou à imprensa que o Vaticano "poderá alterar
uma frase, uma palavra, não a substância". Mas há quem se
sinta mais seguro apoiado na ampla divulgação dêles, e um
religioso chegou a afirmar: "Nada mais lógico. Fizemos os
documentos para o povo e não para o Papa. Mantê-los em
segrêdo seria defraudar a expectativa de quem solicita de
nós uma tomada urgente de posição".

Visão da realidade — Tôdas as passagens do documento, mesmo
as que não se referem diretamente ao problema social, estão
marcadas pela preocupação de não perdê-lo de vista. Fala-
se, com insistência, em "massas marginalizadas que precisam
ser integradas na vida econômica das nações". E na parte
que se refere especìficamente ao problema social há
denúncias contundentes. Afirma a existência na América
Latina de "uma conspiração calada e eficaz contra a paz",
cujas causas se encontram no "colonialismo interno" e
nos "monopólios internacionais". Considera a situação
social do continente como "uma violência
institucionalizada". Finalmente, o documento adverte: "Não
devemos estranhar a tentação da violência. É mais
surpreendente a paciência de um povo que suporta durante
anos uma condição que não aceitariam nunca os que têm uma
consciência desenvolvida dos direitos humanos".

Resposta à violência — Quanto à definição do direito de
resposta a essa "violência institucionalizada", vai mais
longe que todos os documentos anteriores ao afirmar que
a "tirania", justificativa dessa resposta, não precisa ser
necessàriamente pessoal, porque pode ser de estruturas. Por
isso os bispos fazem um apêlo: "Chamamos de maneira urgente
a quantos participam nas responsabilidades e na posse dos
bens, a fim de que não utilizem a posição pacífica da
Igreja para impedir as transformações profundas que são
necessárias. Se retêm seus privilégios usando meios
violentos, se fazem responsáveis, ante a História, de
provocar as revoluções explosivas do Desespêro". A
Conferência não fêz polêmica nem tomou as "posições
avançadas" tão esperadas, especialmente pelos observadores
e jornalistas europeus e americanos, em relação à
encíclica "Humanae Vitae", sôbre a pílula anticoncepcional.
Apenas repetiu o próprio Papa ao afirmar que a
encíclica "não diminui a responsabilidade nem a liberdade
dos cônjuges, aos quais não proíbe uma honesta e razoável
limitação da natalidade, nem terapêuticas legítimas, nem o
progresso da investigação científica". Mas fêz a condenação
de todo programa que procure um contrôle da natalidade a
qualquer preço.

Um jôgo à parte — Cinco bispos colombianos, certamente não
acostumados com o repertório de idéias mais progressistas
que predominou na Conferência, assinaram um manifesto
reprovando as conclusões da CELAM, mas perderam o prazo
regimental para entrega do documento à discussão.
Publicaram-no então pelos jornais na véspera do
encerramento da Conferência, evidenciando o abalo que as
novas idéias causaram na conservadora Igreja colombiana —
além da intenção de clamar logo, para consumo interno, "não
concordamos com isso". Agora que a Conferência acabou,
permanece a dúvida sôbre os motivos que mantiveram fora dos
debates o problema das relações Igreja — Estado e do
celibato clerical.

As dúvidas que ficam — E ficam as perguntas: 1) Que
condições para aplicar os planos de trabalho agora
aprovados terão as igrejas dos vários países latino-
americanos onde ainda existem concordatas entre Igreja e
Estado, origem de privilégios que ela diz querer dispensar?
2) Como suprir a falta crescente de sacerdotes, se o número
de candidatos aos seminários diminui, enquanto aumenta o de
padres que abandonam a batina para casar? A Conferência
apenas reiterou a conveniência da ordenação de diáconos
casados. Mas vetou sistemàticamente as tentativas de
discutir o assunto celibato. O Padre Boaventura
Kloppemburg, diretor da "Revista Eclesiástica Brasileira",
participante da Conferência como perito teólogo, explica
sorrindo por que o celibato continua sendo mantido: "Os
bispos são muito valentes quando se trata de reformas
externas. Na hora das reformas internas da Igreja, recuam".

Até o fim — Mas há um grupo que pretenderia ir muito além
das conclusões da CELAM e levar a "luta pela justiça
social" às últimas conseqüências: os "camilistas". Durante
a reunião da CELAM apareceu silenciosamente debaixo das
portas dos aposentos de bispos e padres um manifesto
impresso em duas fôlhas e assinado por trinta
padres "camilistas". Essencialmente, pediam ação
concreta: "O que importa no mundo de hoje não é a verdade
teórica. Na realidade, o que não leva ao compromisso na
ação é uma verdade pela metade". Exigiam também uma ação
política: "Hoje em dia, não se pode desvincular o problema
social do problema político. Em conseqüência, afirmamos com
tôda clareza: a solução do problema social está na ordem
política, ou seja, trata-se de um compromisso concreto com
as mudanças na sociedade a partir de programas e de linhas
de ação. Quando dizemos que comprometer-se em política é o
melhor meio de amar e de trabalhar pelos pobres e os
marginalizados, não queremos dar a entender que estamos de
acôrdo com uma Igreja que por temor ao servilismo abdica de
seus direitos e obrigações mais fundamentais nas relações
diplomáticas com os organismos estatais".
Dom Avelar: um presidente brasileiro.

O exemplo de Camilo — Entre êsses sacerdotes, Camilo
Torres, o padre-guerrilheiro colombiano morto numa
emboscada em 1966, é considerado quase um santo. Padre
Juan, pároco de bairro operário em Bogotá, faz êste
comentário: "Camilo Torres é o primeiro sacerdote que deu
um testemunho evangélico neste país. É o cristão modêlo do
século XX." Aparentemente, a atividade do Padre Juan na sua
paróquia é igual à de qualquer outro sacerdote. No entanto,
suas preocupações maiores se dirigem ao trabalho que
considera o mais importante. Seu ponto de partida é uma
associação cultural do bairro, onde promove diversos cursos
e discussões "para eslarecer o povo, social e
polìticamente". Com um núcleo de líderes mais ativos já
formados nesse trabalho, parte agora para a formação de
associações semelhantes em outros bairros. Ninguém sabe
calcular o número de padres "camilistas" na América Latina.
Há "camilistas" de vários graus na Colômbia e nos países
próximos mais atingidos pelo romantismo do padre-
guerrilheiro. A idéia geral que os identifica e une é a de
não se preocuparem com a luta interna da Igreja: preferem
trabalhar em contato com as classes mais pobres.

Os frutos da CELAM — As figuras mais representativas da
Igreja latino-americana estão satisfeitas com os resultados
da reunião de Bogotá. Dom Helder Camara define assim a sua
importância histórica: "O que parecia voz isolada de um ou
de outro bispo, de um punhado de padres, de alguns leigos
exaltados, já agora ninguém pode duvidar, é a palavra de
tôda a hierarquia latino-americana. Leiam-se, estudem-se
documentos como os capítulos sôbre justiça e paz, pastoral
de massas e pastoral de elites, educação, e se verá que
quem quiser chamar de subversivo e vermelho o bispo que
exigir reforma de estruturas e mudanças graduais, mais
profundas e rápidas (gradual se opõe a brusco e não a
rápido), vai ter de chamar de subversivos e comunistas
todos os bispos da América Latina. Não pode haver
assembléia mais oficial: convocada e aberta pelo Papa,
presidida por três legados, seus, teve como membros bispos
eleitos pelas respectivas conferências episcopais". Acha
que são boas as condições e perspectivas para a aplicação
pelo episcopado das resoluções tomadas. Tão boas quanto as
que existiam para a aplicação das conclusões do Concílio
Ecumênico e com uma vantagem: "Os bispos latino-americanos
são homens angustiados com a realidade que os envolve e que
contrasta com a palavra do Evangelho, em um continente de
maioria cristã".
A VIOLÊNCIA CRISTÃ,
UMA QUESTÃO DE ÉPOCA

Jesus foi o primeiro cristão a empregar a violência em nome
de Deus, para expulsar os vendilhões do templo de
Jerusalém. Os que o viram açoitando os mercadores e
esparramando pelo chão o dinheiro dos cambistas
compreenderam seu gesto, lembrando-se do que profetizavam
as Escrituras: "O zêlo da Tua casa me consumirá". Mas esta
foi a única vez em que Jesus usou a violência. Quando um de
seus discípulos atacou os soldados que o foram prender,
guiados por Judas Iscariotes, Cristo fêz uma
advertência: "Embainha a tua espada; pois todos os que
lançam mão da espada, à espada perecerão". Os primeiros
cristãos opunham-se a qualquer espécie de violência e
acreditavam que tôdas as injustiças sofridas na terra
seriam plenamente recompensadas pelos "galardões" celestes.
No século IV essas idéias sofreram modificações. Entre 380
e 392, através de uma série de decretos, o cristianismo foi
reconhecido como a única fé legítima do Império Romano. Já
nessa época Santo Agostinho (354-430) admitia abertamente o
uso da violência para cobater a injustiça. No seu "Tratado
do Livre Arbítrio" êle defendia, inclusive, a implantação
de uma ditadura exercida por "uns poucos bons" quando o
povo não fôsse capaz de escolher governantes competentes
por causa de sua própria corrupção.

A lei injusta — O pensamento de Santo Agostinho teve grande
influência sôbre Santo Tomás de Aquino (1225-1274).

Nas suas considerações sôbre a natureza das leis,
diz: "Quando as leis são injustas, o súdito não tem
obrigação, em em consciência, de obedecê-las, pois estas
leis são mais violências do que leis". Em casos de legítima
defesa e de guerras onde se reconheça que houve um "mandado
divino" Santo Tomás diz que "sem nenhuma injustiça pode ser
infligida a morte a qualquer homem". Mas essa linha de
pensamento já existia antes de Aquino. Os papas levantaram
os nobres para as Cruzadas contra os turcos que se haviam
apoderado da Terra Santa. Elas começaram em 1096, pouco
depois do Concílio de Clermont, convocado pelo Papa Urbano
II, e do discurso inflamado que fêz diante dos nobres
franceses: "Entrai no caminho do Santo Sepulcro; arrebatai
a terra da raça fraca e submetei-a a vós".

A violência justa — Hoje a igreja justifica a violência em
apenas um caso: a revolta contra a "tirania prolongada que
ofendesse gravemente os direitos humanos e prejudicasse o
bem comum do país". É o que diz a "Populorum Progressio",
encíclica do Papa Paulo VI. Mas nos pronunciamentos
recentes que fêz em Bogotá, Paulo VI condenou tôdas as
formas de violência. Provàvelmente com receio das atitudes
extremadas tomadas por alguns padres como Camilo Torres, ou
mesmo o Padre José Comblin, ex-professor do Instituto
Teológico do Recife e autor de um estudo que deveria ser
apresentado na reunião da CELAM. Comblin dizia expor no
documento "princípio filosófico gerais tirados de Santo
Tomás de Aquino". O documento defende o direito de se tomar
à fôrça o poder de maus governantes e de se impor, também à
fôrça, leis justas. Comblin levou bem longe os meios que
considera admissíveis para a conquista do poder: "Não
bastará a boa consonância. Será necessário estudar os meios
própios da ciência do poder e da arte da conquista do
poder. Será necassário estudar a estratégia e a tática.
Será necessário fazer alianças, entrar em compromissos,
sujar as mãos pelas alianças sujas".


CASADOS, QUASE PADRES,
OS DIÁCONOS VÊM DO BRASIL

Um professor, um operário, um barbeiro e um contador, todos
brasileiros e casados, são os primeiros diáconos leigos
permanentes da América Latina. Receberam a ordenação do
próprio Papa, há duas semanas, durante o 39º Congresso
Eucarístico Internacional realizado em Bogotá, juntamente
com 140 sacerdotes e 37 diáconos não leigos, seminaristas
no último estágio antes da ordenação como padres. Os alto-
falantes do Campo Eucarístico anunciaram o acontecimento
discretamente. E nessa discrição ficou escondida a grande
importância dêsse ato para a Igreja Católica: pode
representar a saída para a crescente falta de padres,
principalmente na América Latina, onde nos últimos anos a
população aumentou em 50 milhões de habitantes e o número
de sacerdotes em apenas 12 mil.

A bandeira do celibato — O operário João, o contador
Benigno, o barbeiro Pedro e o professor Alexandre podem
representar também um bom argumento para o movimento contra
o celibato clerical, se conseguirem provar que é possível
realizar um ministério eficiente e ao mesmo tempo cuidar da
família e dos seus negócios particulares. O Professor
Alexandre Henrique Gruszyinsky, gaúcho de Pôrto Alegre, 36
anos de idade, consultor jurídico do Estado e professor de
Direito Canônico na Pontifícia Universidade Católica,
acredita que isso seja possível. Êle dispensaria a honra de
ser ordenado pelo Papa em Bogotá, para receber a nomeação
em Pôrto Alegre mesmo, de qualquer bispo, cercado pelos
parentes e amigos entre os quais terá de trabalhar. Fêz a
viagem mais com um sentimento de missão. Queria participar
de uma cerimônia, capaz de mostrar aos fiéis de todo o
mundo que o Papa não só tolera o diaconato permanente, mas
o deseja. Levou sua mulher e sua mãe, deixando os dois
filhos em casa.

João não muda — João Gonçalves Pereira, 47 anos, operário,
quer continuar sendo o mesmo João que todos conhecem em
Mata de São João, na Bahia, uma cidadezinha de 13 mil
habitantes, a 55 quilômetros de Salvador. O título de
diácono só o fará ajudar com mais vontade o Padre
Astrogildo, responsável por uma área onde vivem "20 ou 30
mil almas". João "não era muito de igreja" até a Páscoa de
1945. Nesse dia estava na Itália como soldado da FEB e nem
sabe bem por que aceitou o convite do capelão para explicar
o significado daquela data religiosa aos outros soldados.
Mas saiu-se bem com a ajuda de um sargento, ex-seminarista.
Desde então passou a se interessar pela religião. Logo
depois de voltar, casou-se com Maria e começou a ajudar o
Padre Astrogildo. Hoje é pai de sete filhos, "o mais velho
já está na idade de prestar o serviço militar".

O contador Benigno — Benigno Lopes Rios, baiano, 39 anos,
casado, seis filhos, pensou em ser irmão marista quando
ainda garôto. Depois desistiu da idéia. Vieram os estudos —
formou-se contador —, o casamento e as crianças. Ajudava o
Padre Vitalmiro, na Paróquia dos Mares, Baixa do Bonfim, em
Salvador, no trabalho de catequese dos presidiários e na
formação de comunidades religiosas. Em 1966, quando o Padre
Vitalmiro o convidou para fazer um curso de diácono,
aceitou logo. E acha que "foi Deus quem iluminou o Padre".
Quando soube que o Papa iria ordenar diáconos em Bogotá,
pediu permissão para ir junto com João Gonçalves Pereira,
embora tivesse que pagar a própria passagem.

Um barbeiro em Bogotá — Em Quirinópolis, uma cidade com 13
mil habitantes, a 360 quilômetros de Goiânia, Pedro Cardoso
da Silva tem sua barbearia. Deixou-a alguns dias nas mãos
do sócio para poder ir a Bogotá ser ordenado diácono pelo
Papa. Levou sua mulher e os cinco filhos. As despesas foram
grandes, mas acha que "a graça de ser ordenado pelo Papa
compensou tudo". Como os outros três, Pedro terá quase
tôdas as responsabilidades de um padre. Os diáconos apenas
não podem oficiar a Missa, ouvir Confissões e ministrar o
Sacramento dos Enfermos.
___________________________________________

08/10/2010 14:19:32
jornal do 10ocelio10....

#Jornal do Célio...
#Assunto Os caminho da Igreja na America Latina

#UMA NOVA MISSÃO

Os bispos progressistas queriam uma Igreja
com a missão obrigatória de participar da luta pelo
progresso material da América Latina.
Conseguiram a adesão dos indecisos e venceram.
A CELAM, vista pelo enviado Fernando Semedo

Quase trezentos bispos passaram duas semanas em Medellin
discutindo os caminhos da Igreja na América Latina. Dom
Antônio Samore, no centro, foto acima, representou o Papa.
Diz que o Vaticano acatará as decisões
da CELAM

O padre mostrava "slides" coloridos e gráficos com muitos
números: a América Latina tinha 200 milhões de habitantes
em 1960, hoje tem 264 milhões e no fim dêste século deverá
alcançar 638 milhões. A renda per capita na América Latina
está perto dos 350 dólares anuais — NCr$ 1.267,00. Apenas
cinco países no continente todo têm índice de analfabetismo
inferior a 20% e três outros chegam a ter mais de 60%. Em
1965, 51% da população em idade escolar freqüentava escolas
e uma projeção bastante otimista mostra que são necessários
pelo menos doze anos para chegar a 98%. A expansão
demográfica não corresponde a um aumento no númento dos
padres: há cada vez menos padres e cada vez mais fiéis. O
número de habitantes por paróquia urbana, por exemplo, já
ultrapassou os 18 mil e continua crescendo verticalmente.
No auditório, quase trezentos católicos de tôda a América
Latina, os participantes da II Conferência do Conselho
Episcopal Latino-Americano, viram e ouviram tudo com
atenção. Depois passaram duas semanas dentro do seminário
maior de Medellin, Côlombia, discutindo dia e noite para
pôr a limpo omissões e culpas do passado e traçar em planos
a responsabilidade que a Igreja Católica assume no trabalho
de transformar a América Latina.

Os três grupos — No comêço ainda era possível distinguir
três tipos de participantes. Uma minoria que não sabia bem
porque estava lá, não via meios nem acreditava na
conveniência de a Igreja se comprometer com a mudança de
uma realidade pouco animadora. Outra minoria — a "minoria
de Abraão", como a chama Dom Helder Camara — cheia de
idéias, disposta a discutir e a mostrar que êsse
compromisso é missão obrigatória de quem se considera parte
do povo de Deus. E uma maioria indecisa, insatisfeita com a
realidade, receptiva ao diálogo, mas sem saber precisamente
como assumir êsse compromisso. Ao longo das duas semanas,
a "minoria de Abraão" comandou o grande grupo dos indecisos
e, juntos, atenderam a pelo menos uma das recomendações que
o Papa lhes havia feito em Bogotá: a de "virar uma página
da História da Igreja latino-americana". "Não esperem os
milagres", disse Dom Avelar Brandão, brasileiro, bispo de
Teresina, um dos três presidentes da Conferência, no dia do
seu encerramento. "Para que tudo isso se efetive, é preciso
uma mobilização geral de todo o povo cristão, dentro e fora
da Igreja. Todos têm de ser sensibilizados pela ideologia
dos documentos finais da Conferência, para salvação dos
povos da América Latina."

O povo e seus pastôres — Êsses documentos foram elaborados
por dezesseis comissões e resumidos num único que será
entregue ao Papa. Uma declaração final, feita pelo Cardeal
Antônio Samore, representante de Paulo VI, não convenceu
muita gente de que seu autor leve nos documentos aprovados
a "prudência" que parecia desejar. A sua preocupação com o
rumo das posições assumidas pelo episcopado chegou a ser
confessada por alguns bispos durante a Conferência. E
tampouco lhes devem ter agradado os aplausos recebidos por
D. José Pires, bispo negro de João Pessoa, quando êste
pediu em plenário que todos pensassem principalmente no
povo de que são pastôres, "sem mêdo do que Roma possa
pensar sôbre as nossas decisões". A própria autorização
para publicação imediata dos documentos — embora êles só
ganhem a categoria de oficiais após o exame papal — foi
vista como mais um fruto do trabalho dos progressistas.
Samore declarou à imprensa que o Vaticano "poderá alterar
uma frase, uma palavra, não a substância". Mas há quem se
sinta mais seguro apoiado na ampla divulgação dêles, e um
religioso chegou a afirmar: "Nada mais lógico. Fizemos os
documentos para o povo e não para o Papa. Mantê-los em
segrêdo seria defraudar a expectativa de quem solicita de
nós uma tomada urgente de posição".

Visão da realidade — Tôdas as passagens do documento, mesmo
as que não se referem diretamente ao problema social, estão
marcadas pela preocupação de não perdê-lo de vista. Fala-
se, com insistência, em "massas marginalizadas que precisam
ser integradas na vida econômica das nações". E na parte
que se refere especìficamente ao problema social há
denúncias contundentes. Afirma a existência na América
Latina de "uma conspiração calada e eficaz contra a paz",
cujas causas se encontram no "colonialismo interno" e
nos "monopólios internacionais". Considera a situação
social do continente como "uma violência
institucionalizada". Finalmente, o documento adverte: "Não
devemos estranhar a tentação da violência. É mais
surpreendente a paciência de um povo que suporta durante
anos uma condição que não aceitariam nunca os que têm uma
consciência desenvolvida dos direitos humanos".

Resposta à violência — Quanto à definição do direito de
resposta a essa "violência institucionalizada", vai mais
longe que todos os documentos anteriores ao afirmar que
a "tirania", justificativa dessa resposta, não precisa ser
necessàriamente pessoal, porque pode ser de estruturas. Por
isso os bispos fazem um apêlo: "Chamamos de maneira urgente
a quantos participam nas responsabilidades e na posse dos
bens, a fim de que não utilizem a posição pacífica da
Igreja para impedir as transformações profundas que são
necessárias. Se retêm seus privilégios usando meios
violentos, se fazem responsáveis, ante a História, de
provocar as revoluções explosivas do Desespêro". A
Conferência não fêz polêmica nem tomou as "posições
avançadas" tão esperadas, especialmente pelos observadores
e jornalistas europeus e americanos, em relação à
encíclica "Humanae Vitae", sôbre a pílula anticoncepcional.
Apenas repetiu o próprio Papa ao afirmar que a
encíclica "não diminui a responsabilidade nem a liberdade
dos cônjuges, aos quais não proíbe uma honesta e razoável
limitação da natalidade, nem terapêuticas legítimas, nem o
progresso da investigação científica". Mas fêz a condenação
de todo programa que procure um contrôle da natalidade a
qualquer preço.

Um jôgo à parte — Cinco bispos colombianos, certamente não
acostumados com o repertório de idéias mais progressistas
que predominou na Conferência, assinaram um manifesto
reprovando as conclusões da CELAM, mas perderam o prazo
regimental para entrega do documento à discussão.
Publicaram-no então pelos jornais na véspera do
encerramento da Conferência, evidenciando o abalo que as
novas idéias causaram na conservadora Igreja colombiana —
além da intenção de clamar logo, para consumo interno, "não
concordamos com isso". Agora que a Conferência acabou,
permanece a dúvida sôbre os motivos que mantiveram fora dos
debates o problema das relações Igreja — Estado e do
celibato clerical.

As dúvidas que ficam — E ficam as perguntas: 1) Que
condições para aplicar os planos de trabalho agora
aprovados terão as igrejas dos vários países latino-
americanos onde ainda existem concordatas entre Igreja e
Estado, origem de privilégios que ela diz querer dispensar?
2) Como suprir a falta crescente de sacerdotes, se o número
de candidatos aos seminários diminui, enquanto aumenta o de
padres que abandonam a batina para casar? A Conferência
apenas reiterou a conveniência da ordenação de diáconos
casados. Mas vetou sistemàticamente as tentativas de
discutir o assunto celibato. O Padre Boaventura
Kloppemburg, diretor da "Revista Eclesiástica Brasileira",
participante da Conferência como perito teólogo, explica
sorrindo por que o celibato continua sendo mantido: "Os
bispos são muito valentes quando se trata de reformas
externas. Na hora das reformas internas da Igreja, recuam".

Até o fim — Mas há um grupo que pretenderia ir muito além
das conclusões da CELAM e levar a "luta pela justiça
social" às últimas conseqüências: os "camilistas". Durante
a reunião da CELAM apareceu silenciosamente debaixo das
portas dos aposentos de bispos e padres um manifesto
impresso em duas fôlhas e assinado por trinta
padres "camilistas". Essencialmente, pediam ação
concreta: "O que importa no mundo de hoje não é a verdade
teórica. Na realidade, o que não leva ao compromisso na
ação é uma verdade pela metade". Exigiam também uma ação
política: "Hoje em dia, não se pode desvincular o problema
social do problema político. Em conseqüência, afirmamos com
tôda clareza: a solução do problema social está na ordem
política, ou seja, trata-se de um compromisso concreto com
as mudanças na sociedade a partir de programas e de linhas
de ação. Quando dizemos que comprometer-se em política é o
melhor meio de amar e de trabalhar pelos pobres e os
marginalizados, não queremos dar a entender que estamos de
acôrdo com uma Igreja que por temor ao servilismo abdica de
seus direitos e obrigações mais fundamentais nas relações
diplomáticas com os organismos estatais".
Dom Avelar: um presidente brasileiro.

O exemplo de Camilo — Entre êsses sacerdotes, Camilo
Torres, o padre-guerrilheiro colombiano morto numa
emboscada em 1966, é considerado quase um santo. Padre
Juan, pároco de bairro operário em Bogotá, faz êste
comentário: "Camilo Torres é o primeiro sacerdote que deu
um testemunho evangélico neste país. É o cristão modêlo do
século XX." Aparentemente, a atividade do Padre Juan na sua
paróquia é igual à de qualquer outro sacerdote. No entanto,
suas preocupações maiores se dirigem ao trabalho que
considera o mais importante. Seu ponto de partida é uma
associação cultural do bairro, onde promove diversos cursos
e discussões "para eslarecer o povo, social e
polìticamente". Com um núcleo de líderes mais ativos já
formados nesse trabalho, parte agora para a formação de
associações semelhantes em outros bairros. Ninguém sabe
calcular o número de padres "camilistas" na América Latina.
Há "camilistas" de vários graus na Colômbia e nos países
próximos mais atingidos pelo romantismo do padre-
guerrilheiro. A idéia geral que os identifica e une é a de
não se preocuparem com a luta interna da Igreja: preferem
trabalhar em contato com as classes mais pobres.

Os frutos da CELAM — As figuras mais representativas da
Igreja latino-americana estão satisfeitas com os resultados
da reunião de Bogotá. Dom Helder Camara define assim a sua
importância histórica: "O que parecia voz isolada de um ou
de outro bispo, de um punhado de padres, de alguns leigos
exaltados, já agora ninguém pode duvidar, é a palavra de
tôda a hierarquia latino-americana. Leiam-se, estudem-se
documentos como os capítulos sôbre justiça e paz, pastoral
de massas e pastoral de elites, educação, e se verá que
quem quiser chamar de subversivo e vermelho o bispo que
exigir reforma de estruturas e mudanças graduais, mais
profundas e rápidas (gradual se opõe a brusco e não a
rápido), vai ter de chamar de subversivos e comunistas
todos os bispos da América Latina. Não pode haver
assembléia mais oficial: convocada e aberta pelo Papa,
presidida por três legados, seus, teve como membros bispos
eleitos pelas respectivas conferências episcopais". Acha
que são boas as condições e perspectivas para a aplicação
pelo episcopado das resoluções tomadas. Tão boas quanto as
que existiam para a aplicação das conclusões do Concílio
Ecumênico e com uma vantagem: "Os bispos latino-americanos
são homens angustiados com a realidade que os envolve e que
contrasta com a palavra do Evangelho, em um continente de
maioria cristã".
A VIOLÊNCIA CRISTÃ,
UMA QUESTÃO DE ÉPOCA

Jesus foi o primeiro cristão a empregar a violência em nome
de Deus, para expulsar os vendilhões do templo de
Jerusalém. Os que o viram açoitando os mercadores e
esparramando pelo chão o dinheiro dos cambistas
compreenderam seu gesto, lembrando-se do que profetizavam
as Escrituras: "O zêlo da Tua casa me consumirá". Mas esta
foi a única vez em que Jesus usou a violência. Quando um de
seus discípulos atacou os soldados que o foram prender,
guiados por Judas Iscariotes, Cristo fêz uma
advertência: "Embainha a tua espada; pois todos os que
lançam mão da espada, à espada perecerão". Os primeiros
cristãos opunham-se a qualquer espécie de violência e
acreditavam que tôdas as injustiças sofridas na terra
seriam plenamente recompensadas pelos "galardões" celestes.
No século IV essas idéias sofreram modificações. Entre 380
e 392, através de uma série de decretos, o cristianismo foi
reconhecido como a única fé legítima do Império Romano. Já
nessa época Santo Agostinho (354-430) admitia abertamente o
uso da violência para cobater a injustiça. No seu "Tratado
do Livre Arbítrio" êle defendia, inclusive, a implantação
de uma ditadura exercida por "uns poucos bons" quando o
povo não fôsse capaz de escolher governantes competentes
por causa de sua própria corrupção.

A lei injusta — O pensamento de Santo Agostinho teve grande
influência sôbre Santo Tomás de Aquino (1225-1274).

Nas suas considerações sôbre a natureza das leis,
diz: "Quando as leis são injustas, o súdito não tem
obrigação, em em consciência, de obedecê-las, pois estas
leis são mais violências do que leis". Em casos de legítima
defesa e de guerras onde se reconheça que houve um "mandado
divino" Santo Tomás diz que "sem nenhuma injustiça pode ser
infligida a morte a qualquer homem". Mas essa linha de
pensamento já existia antes de Aquino. Os papas levantaram
os nobres para as Cruzadas contra os turcos que se haviam
apoderado da Terra Santa. Elas começaram em 1096, pouco
depois do Concílio de Clermont, convocado pelo Papa Urbano
II, e do discurso inflamado que fêz diante dos nobres
franceses: "Entrai no caminho do Santo Sepulcro; arrebatai
a terra da raça fraca e submetei-a a vós".

A violência justa — Hoje a igreja justifica a violência em
apenas um caso: a revolta contra a "tirania prolongada que
ofendesse gravemente os direitos humanos e prejudicasse o
bem comum do país". É o que diz a "Populorum Progressio",
encíclica do Papa Paulo VI. Mas nos pronunciamentos
recentes que fêz em Bogotá, Paulo VI condenou tôdas as
formas de violência. Provàvelmente com receio das atitudes
extremadas tomadas por alguns padres como Camilo Torres, ou
mesmo o Padre José Comblin, ex-professor do Instituto
Teológico do Recife e autor de um estudo que deveria ser
apresentado na reunião da CELAM. Comblin dizia expor no
documento "princípio filosófico gerais tirados de Santo
Tomás de Aquino". O documento defende o direito de se tomar
à fôrça o poder de maus governantes e de se impor, também à
fôrça, leis justas. Comblin levou bem longe os meios que
considera admissíveis para a conquista do poder: "Não
bastará a boa consonância. Será necessário estudar os meios
própios da ciência do poder e da arte da conquista do
poder. Será necassário estudar a estratégia e a tática.
Será necessário fazer alianças, entrar em compromissos,
sujar as mãos pelas alianças sujas".


CASADOS, QUASE PADRES,
OS DIÁCONOS VÊM DO BRASIL

Um professor, um operário, um barbeiro e um contador, todos
brasileiros e casados, são os primeiros diáconos leigos
permanentes da América Latina. Receberam a ordenação do
próprio Papa, há duas semanas, durante o 39º Congresso
Eucarístico Internacional realizado em Bogotá, juntamente
com 140 sacerdotes e 37 diáconos não leigos, seminaristas
no último estágio antes da ordenação como padres. Os alto-
falantes do Campo Eucarístico anunciaram o acontecimento
discretamente. E nessa discrição ficou escondida a grande
importância dêsse ato para a Igreja Católica: pode
representar a saída para a crescente falta de padres,
principalmente na América Latina, onde nos últimos anos a
população aumentou em 50 milhões de habitantes e o número
de sacerdotes em apenas 12 mil.

A bandeira do celibato — O operário João, o contador
Benigno, o barbeiro Pedro e o professor Alexandre podem
representar também um bom argumento para o movimento contra
o celibato clerical, se conseguirem provar que é possível
realizar um ministério eficiente e ao mesmo tempo cuidar da
família e dos seus negócios particulares. O Professor
Alexandre Henrique Gruszyinsky, gaúcho de Pôrto Alegre, 36
anos de idade, consultor jurídico do Estado e professor de
Direito Canônico na Pontifícia Universidade Católica,
acredita que isso seja possível. Êle dispensaria a honra de
ser ordenado pelo Papa em Bogotá, para receber a nomeação
em Pôrto Alegre mesmo, de qualquer bispo, cercado pelos
parentes e amigos entre os quais terá de trabalhar. Fêz a
viagem mais com um sentimento de missão. Queria participar
de uma cerimônia, capaz de mostrar aos fiéis de todo o
mundo que o Papa não só tolera o diaconato permanente, mas
o deseja. Levou sua mulher e sua mãe, deixando os dois
filhos em casa.

João não muda — João Gonçalves Pereira, 47 anos, operário,
quer continuar sendo o mesmo João que todos conhecem em
Mata de São João, na Bahia, uma cidadezinha de 13 mil
habitantes, a 55 quilômetros de Salvador. O título de
diácono só o fará ajudar com mais vontade o Padre
Astrogildo, responsável por uma área onde vivem "20 ou 30
mil almas". João "não era muito de igreja" até a Páscoa de
1945. Nesse dia estava na Itália como soldado da FEB e nem
sabe bem por que aceitou o convite do capelão para explicar
o significado daquela data religiosa aos outros soldados.
Mas saiu-se bem com a ajuda de um sargento, ex-seminarista.
Desde então passou a se interessar pela religião. Logo
depois de voltar, casou-se com Maria e começou a ajudar o
Padre Astrogildo. Hoje é pai de sete filhos, "o mais velho
já está na idade de prestar o serviço militar".

O contador Benigno — Benigno Lopes Rios, baiano, 39 anos,
casado, seis filhos, pensou em ser irmão marista quando
ainda garôto. Depois desistiu da idéia. Vieram os estudos —
formou-se contador —, o casamento e as crianças. Ajudava o
Padre Vitalmiro, na Paróquia dos Mares, Baixa do Bonfim, em
Salvador, no trabalho de catequese dos presidiários e na
formação de comunidades religiosas. Em 1966, quando o Padre
Vitalmiro o convidou para fazer um curso de diácono,
aceitou logo. E acha que "foi Deus quem iluminou o Padre".
Quando soube que o Papa iria ordenar diáconos em Bogotá,
pediu permissão para ir junto com João Gonçalves Pereira,
embora tivesse que pagar a própria passagem.

Um barbeiro em Bogotá — Em Quirinópolis, uma cidade com 13
mil habitantes, a 360 quilômetros de Goiânia, Pedro Cardoso
da Silva tem sua barbearia. Deixou-a alguns dias nas mãos
do sócio para poder ir a Bogotá ser ordenado diácono pelo
Papa. Levou sua mulher e os cinco filhos. As despesas foram
grandes, mas acha que "a graça de ser ordenado pelo Papa
compensou tudo". Como os outros três, Pedro terá quase
tôdas as responsabilidades de um padre. Os diáconos apenas
não podem oficiar a Missa, ouvir Confissões e ministrar o
Sacramento dos Enfermos.
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08/10/2010 14:19:35
jornal do 10ocelio10....

#Jornal do Célio...
#Assunto Os caminho da Igreja na America Latina

#UMA NOVA MISSÃO

Os bispos progressistas queriam uma Igreja
com a missão obrigatória de participar da luta pelo
progresso material da América Latina.
Conseguiram a adesão dos indecisos e venceram.
A CELAM, vista pelo enviado Fernando Semedo

Quase trezentos bispos passaram duas semanas em Medellin
discutindo os caminhos da Igreja na América Latina. Dom
Antônio Samore, no centro, foto acima, representou o Papa.
Diz que o Vaticano acatará as decisões
da CELAM

O padre mostrava "slides" coloridos e gráficos com muitos
números: a América Latina tinha 200 milhões de habitantes
em 1960, hoje tem 264 milhões e no fim dêste século deverá
alcançar 638 milhões. A renda per capita na América Latina
está perto dos 350 dólares anuais — NCr$ 1.267,00. Apenas
cinco países no continente todo têm índice de analfabetismo
inferior a 20% e três outros chegam a ter mais de 60%. Em
1965, 51% da população em idade escolar freqüentava escolas
e uma projeção bastante otimista mostra que são necessários
pelo menos doze anos para chegar a 98%. A expansão
demográfica não corresponde a um aumento no númento dos
padres: há cada vez menos padres e cada vez mais fiéis. O
número de habitantes por paróquia urbana, por exemplo, já
ultrapassou os 18 mil e continua crescendo verticalmente.
No auditório, quase trezentos católicos de tôda a América
Latina, os participantes da II Conferência do Conselho
Episcopal Latino-Americano, viram e ouviram tudo com
atenção. Depois passaram duas semanas dentro do seminário
maior de Medellin, Côlombia, discutindo dia e noite para
pôr a limpo omissões e culpas do passado e traçar em planos
a responsabilidade que a Igreja Católica assume no trabalho
de transformar a América Latina.

Os três grupos — No comêço ainda era possível distinguir
três tipos de participantes. Uma minoria que não sabia bem
porque estava lá, não via meios nem acreditava na
conveniência de a Igreja se comprometer com a mudança de
uma realidade pouco animadora. Outra minoria — a "minoria
de Abraão", como a chama Dom Helder Camara — cheia de
idéias, disposta a discutir e a mostrar que êsse
compromisso é missão obrigatória de quem se considera parte
do povo de Deus. E uma maioria indecisa, insatisfeita com a
realidade, receptiva ao diálogo, mas sem saber precisamente
como assumir êsse compromisso. Ao longo das duas semanas,
a "minoria de Abraão" comandou o grande grupo dos indecisos
e, juntos, atenderam a pelo menos uma das recomendações que
o Papa lhes havia feito em Bogotá: a de "virar uma página
da História da Igreja latino-americana". "Não esperem os
milagres", disse Dom Avelar Brandão, brasileiro, bispo de
Teresina, um dos três presidentes da Conferência, no dia do
seu encerramento. "Para que tudo isso se efetive, é preciso
uma mobilização geral de todo o povo cristão, dentro e fora
da Igreja. Todos têm de ser sensibilizados pela ideologia
dos documentos finais da Conferência, para salvação dos
povos da América Latina."

O povo e seus pastôres — Êsses documentos foram elaborados
por dezesseis comissões e resumidos num único que será
entregue ao Papa. Uma declaração final, feita pelo Cardeal
Antônio Samore, representante de Paulo VI, não convenceu
muita gente de que seu autor leve nos documentos aprovados
a "prudência" que parecia desejar. A sua preocupação com o
rumo das posições assumidas pelo episcopado chegou a ser
confessada por alguns bispos durante a Conferência. E
tampouco lhes devem ter agradado os aplausos recebidos por
D. José Pires, bispo negro de João Pessoa, quando êste
pediu em plenário que todos pensassem principalmente no
povo de que são pastôres, "sem mêdo do que Roma possa
pensar sôbre as nossas decisões". A própria autorização
para publicação imediata dos documentos — embora êles só
ganhem a categoria de oficiais após o exame papal — foi
vista como mais um fruto do trabalho dos progressistas.
Samore declarou à imprensa que o Vaticano "poderá alterar
uma frase, uma palavra, não a substância". Mas há quem se
sinta mais seguro apoiado na ampla divulgação dêles, e um
religioso chegou a afirmar: "Nada mais lógico. Fizemos os
documentos para o povo e não para o Papa. Mantê-los em
segrêdo seria defraudar a expectativa de quem solicita de
nós uma tomada urgente de posição".

Visão da realidade — Tôdas as passagens do documento, mesmo
as que não se referem diretamente ao problema social, estão
marcadas pela preocupação de não perdê-lo de vista. Fala-
se, com insistência, em "massas marginalizadas que precisam
ser integradas na vida econômica das nações". E na parte
que se refere especìficamente ao problema social há
denúncias contundentes. Afirma a existência na América
Latina de "uma conspiração calada e eficaz contra a paz",
cujas causas se encontram no "colonialismo interno" e
nos "monopólios internacionais". Considera a situação
social do continente como "uma violência
institucionalizada". Finalmente, o documento adverte: "Não
devemos estranhar a tentação da violência. É mais
surpreendente a paciência de um povo que suporta durante
anos uma condição que não aceitariam nunca os que têm uma
consciência desenvolvida dos direitos humanos".

Resposta à violência — Quanto à definição do direito de
resposta a essa "violência institucionalizada", vai mais
longe que todos os documentos anteriores ao afirmar que
a "tirania", justificativa dessa resposta, não precisa ser
necessàriamente pessoal, porque pode ser de estruturas. Por
isso os bispos fazem um apêlo: "Chamamos de maneira urgente
a quantos participam nas responsabilidades e na posse dos
bens, a fim de que não utilizem a posição pacífica da
Igreja para impedir as transformações profundas que são
necessárias. Se retêm seus privilégios usando meios
violentos, se fazem responsáveis, ante a História, de
provocar as revoluções explosivas do Desespêro". A
Conferência não fêz polêmica nem tomou as "posições
avançadas" tão esperadas, especialmente pelos observadores
e jornalistas europeus e americanos, em relação à
encíclica "Humanae Vitae", sôbre a pílula anticoncepcional.
Apenas repetiu o próprio Papa ao afirmar que a
encíclica "não diminui a responsabilidade nem a liberdade
dos cônjuges, aos quais não proíbe uma honesta e razoável
limitação da natalidade, nem terapêuticas legítimas, nem o
progresso da investigação científica". Mas fêz a condenação
de todo programa que procure um contrôle da natalidade a
qualquer preço.

Um jôgo à parte — Cinco bispos colombianos, certamente não
acostumados com o repertório de idéias mais progressistas
que predominou na Conferência, assinaram um manifesto
reprovando as conclusões da CELAM, mas perderam o prazo
regimental para entrega do documento à discussão.
Publicaram-no então pelos jornais na véspera do
encerramento da Conferência, evidenciando o abalo que as
novas idéias causaram na conservadora Igreja colombiana —
além da intenção de clamar logo, para consumo interno, "não
concordamos com isso". Agora que a Conferência acabou,
permanece a dúvida sôbre os motivos que mantiveram fora dos
debates o problema das relações Igreja — Estado e do
celibato clerical.

As dúvidas que ficam — E ficam as perguntas: 1) Que
condições para aplicar os planos de trabalho agora
aprovados terão as igrejas dos vários países latino-
americanos onde ainda existem concordatas entre Igreja e
Estado, origem de privilégios que ela diz querer dispensar?
2) Como suprir a falta crescente de sacerdotes, se o número
de candidatos aos seminários diminui, enquanto aumenta o de
padres que abandonam a batina para casar? A Conferência
apenas reiterou a conveniência da ordenação de diáconos
casados. Mas vetou sistemàticamente as tentativas de
discutir o assunto celibato. O Padre Boaventura
Kloppemburg, diretor da "Revista Eclesiástica Brasileira",
participante da Conferência como perito teólogo, explica
sorrindo por que o celibato continua sendo mantido: "Os
bispos são muito valentes quando se trata de reformas
externas. Na hora das reformas internas da Igreja, recuam".

Até o fim — Mas há um grupo que pretenderia ir muito além
das conclusões da CELAM e levar a "luta pela justiça
social" às últimas conseqüências: os "camilistas". Durante
a reunião da CELAM apareceu silenciosamente debaixo das
portas dos aposentos de bispos e padres um manifesto
impresso em duas fôlhas e assinado por trinta
padres "camilistas". Essencialmente, pediam ação
concreta: "O que importa no mundo de hoje não é a verdade
teórica. Na realidade, o que não leva ao compromisso na
ação é uma verdade pela metade". Exigiam também uma ação
política: "Hoje em dia, não se pode desvincular o problema
social do problema político. Em conseqüência, afirmamos com
tôda clareza: a solução do problema social está na ordem
política, ou seja, trata-se de um compromisso concreto com
as mudanças na sociedade a partir de programas e de linhas
de ação. Quando dizemos que comprometer-se em política é o
melhor meio de amar e de trabalhar pelos pobres e os
marginalizados, não queremos dar a entender que estamos de
acôrdo com uma Igreja que por temor ao servilismo abdica de
seus direitos e obrigações mais fundamentais nas relações
diplomáticas com os organismos estatais".
Dom Avelar: um presidente brasileiro.

O exemplo de Camilo — Entre êsses sacerdotes, Camilo
Torres, o padre-guerrilheiro colombiano morto numa
emboscada em 1966, é considerado quase um santo. Padre
Juan, pároco de bairro operário em Bogotá, faz êste
comentário: "Camilo Torres é o primeiro sacerdote que deu
um testemunho evangélico neste país. É o cristão modêlo do
século XX." Aparentemente, a atividade do Padre Juan na sua
paróquia é igual à de qualquer outro sacerdote. No entanto,
suas preocupações maiores se dirigem ao trabalho que
considera o mais importante. Seu ponto de partida é uma
associação cultural do bairro, onde promove diversos cursos
e discussões "para eslarecer o povo, social e
polìticamente". Com um núcleo de líderes mais ativos já
formados nesse trabalho, parte agora para a formação de
associações semelhantes em outros bairros. Ninguém sabe
calcular o número de padres "camilistas" na América Latina.
Há "camilistas" de vários graus na Colômbia e nos países
próximos mais atingidos pelo romantismo do padre-
guerrilheiro. A idéia geral que os identifica e une é a de
não se preocuparem com a luta interna da Igreja: preferem
trabalhar em contato com as classes mais pobres.

Os frutos da CELAM — As figuras mais representativas da
Igreja latino-americana estão satisfeitas com os resultados
da reunião de Bogotá. Dom Helder Camara define assim a sua
importância histórica: "O que parecia voz isolada de um ou
de outro bispo, de um punhado de padres, de alguns leigos
exaltados, já agora ninguém pode duvidar, é a palavra de
tôda a hierarquia latino-americana. Leiam-se, estudem-se
documentos como os capítulos sôbre justiça e paz, pastoral
de massas e pastoral de elites, educação, e se verá que
quem quiser chamar de subversivo e vermelho o bispo que
exigir reforma de estruturas e mudanças graduais, mais
profundas e rápidas (gradual se opõe a brusco e não a
rápido), vai ter de chamar de subversivos e comunistas
todos os bispos da América Latina. Não pode haver
assembléia mais oficial: convocada e aberta pelo Papa,
presidida por três legados, seus, teve como membros bispos
eleitos pelas respectivas conferências episcopais". Acha
que são boas as condições e perspectivas para a aplicação
pelo episcopado das resoluções tomadas. Tão boas quanto as
que existiam para a aplicação das conclusões do Concílio
Ecumênico e com uma vantagem: "Os bispos latino-americanos
são homens angustiados com a realidade que os envolve e que
contrasta com a palavra do Evangelho, em um continente de
maioria cristã".
A VIOLÊNCIA CRISTÃ,
UMA QUESTÃO DE ÉPOCA

Jesus foi o primeiro cristão a empregar a violência em nome
de Deus, para expulsar os vendilhões do templo de
Jerusalém. Os que o viram açoitando os mercadores e
esparramando pelo chão o dinheiro dos cambistas
compreenderam seu gesto, lembrando-se do que profetizavam
as Escrituras: "O zêlo da Tua casa me consumirá". Mas esta
foi a única vez em que Jesus usou a violência. Quando um de
seus discípulos atacou os soldados que o foram prender,
guiados por Judas Iscariotes, Cristo fêz uma
advertência: "Embainha a tua espada; pois todos os que
lançam mão da espada, à espada perecerão". Os primeiros
cristãos opunham-se a qualquer espécie de violência e
acreditavam que tôdas as injustiças sofridas na terra
seriam plenamente recompensadas pelos "galardões" celestes.
No século IV essas idéias sofreram modificações. Entre 380
e 392, através de uma série de decretos, o cristianismo foi
reconhecido como a única fé legítima do Império Romano. Já
nessa época Santo Agostinho (354-430) admitia abertamente o
uso da violência para cobater a injustiça. No seu "Tratado
do Livre Arbítrio" êle defendia, inclusive, a implantação
de uma ditadura exercida por "uns poucos bons" quando o
povo não fôsse capaz de escolher governantes competentes
por causa de sua própria corrupção.

A lei injusta — O pensamento de Santo Agostinho teve grande
influência sôbre Santo Tomás de Aquino (1225-1274).

Nas suas considerações sôbre a natureza das leis,
diz: "Quando as leis são injustas, o súdito não tem
obrigação, em em consciência, de obedecê-las, pois estas
leis são mais violências do que leis". Em casos de legítima
defesa e de guerras onde se reconheça que houve um "mandado
divino" Santo Tomás diz que "sem nenhuma injustiça pode ser
infligida a morte a qualquer homem". Mas essa linha de
pensamento já existia antes de Aquino. Os papas levantaram
os nobres para as Cruzadas contra os turcos que se haviam
apoderado da Terra Santa. Elas começaram em 1096, pouco
depois do Concílio de Clermont, convocado pelo Papa Urbano
II, e do discurso inflamado que fêz diante dos nobres
franceses: "Entrai no caminho do Santo Sepulcro; arrebatai
a terra da raça fraca e submetei-a a vós".

A violência justa — Hoje a igreja justifica a violência em
apenas um caso: a revolta contra a "tirania prolongada que
ofendesse gravemente os direitos humanos e prejudicasse o
bem comum do país". É o que diz a "Populorum Progressio",
encíclica do Papa Paulo VI. Mas nos pronunciamentos
recentes que fêz em Bogotá, Paulo VI condenou tôdas as
formas de violência. Provàvelmente com receio das atitudes
extremadas tomadas por alguns padres como Camilo Torres, ou
mesmo o Padre José Comblin, ex-professor do Instituto
Teológico do Recife e autor de um estudo que deveria ser
apresentado na reunião da CELAM. Comblin dizia expor no
documento "princípio filosófico gerais tirados de Santo
Tomás de Aquino". O documento defende o direito de se tomar
à fôrça o poder de maus governantes e de se impor, também à
fôrça, leis justas. Comblin levou bem longe os meios que
considera admissíveis para a conquista do poder: "Não
bastará a boa consonância. Será necessário estudar os meios
própios da ciência do poder e da arte da conquista do
poder. Será necassário estudar a estratégia e a tática.
Será necessário fazer alianças, entrar em compromissos,
sujar as mãos pelas alianças sujas".


CASADOS, QUASE PADRES,
OS DIÁCONOS VÊM DO BRASIL

Um professor, um operário, um barbeiro e um contador, todos
brasileiros e casados, são os primeiros diáconos leigos
permanentes da América Latina. Receberam a ordenação do
próprio Papa, há duas semanas, durante o 39º Congresso
Eucarístico Internacional realizado em Bogotá, juntamente
com 140 sacerdotes e 37 diáconos não leigos, seminaristas
no último estágio antes da ordenação como padres. Os alto-
falantes do Campo Eucarístico anunciaram o acontecimento
discretamente. E nessa discrição ficou escondida a grande
importância dêsse ato para a Igreja Católica: pode
representar a saída para a crescente falta de padres,
principalmente na América Latina, onde nos últimos anos a
população aumentou em 50 milhões de habitantes e o número
de sacerdotes em apenas 12 mil.

A bandeira do celibato — O operário João, o contador
Benigno, o barbeiro Pedro e o professor Alexandre podem
representar também um bom argumento para o movimento contra
o celibato clerical, se conseguirem provar que é possível
realizar um ministério eficiente e ao mesmo tempo cuidar da
família e dos seus negócios particulares. O Professor
Alexandre Henrique Gruszyinsky, gaúcho de Pôrto Alegre, 36
anos de idade, consultor jurídico do Estado e professor de
Direito Canônico na Pontifícia Universidade Católica,
acredita que isso seja possível. Êle dispensaria a honra de
ser ordenado pelo Papa em Bogotá, para receber a nomeação
em Pôrto Alegre mesmo, de qualquer bispo, cercado pelos
parentes e amigos entre os quais terá de trabalhar. Fêz a
viagem mais com um sentimento de missão. Queria participar
de uma cerimônia, capaz de mostrar aos fiéis de todo o
mundo que o Papa não só tolera o diaconato permanente, mas
o deseja. Levou sua mulher e sua mãe, deixando os dois
filhos em casa.

João não muda — João Gonçalves Pereira, 47 anos, operário,
quer continuar sendo o mesmo João que todos conhecem em
Mata de São João, na Bahia, uma cidadezinha de 13 mil
habitantes, a 55 quilômetros de Salvador. O título de
diácono só o fará ajudar com mais vontade o Padre
Astrogildo, responsável por uma área onde vivem "20 ou 30
mil almas". João "não era muito de igreja" até a Páscoa de
1945. Nesse dia estava na Itália como soldado da FEB e nem
sabe bem por que aceitou o convite do capelão para explicar
o significado daquela data religiosa aos outros soldados.
Mas saiu-se bem com a ajuda de um sargento, ex-seminarista.
Desde então passou a se interessar pela religião. Logo
depois de voltar, casou-se com Maria e começou a ajudar o
Padre Astrogildo. Hoje é pai de sete filhos, "o mais velho
já está na idade de prestar o serviço militar".

O contador Benigno — Benigno Lopes Rios, baiano, 39 anos,
casado, seis filhos, pensou em ser irmão marista quando
ainda garôto. Depois desistiu da idéia. Vieram os estudos —
formou-se contador —, o casamento e as crianças. Ajudava o
Padre Vitalmiro, na Paróquia dos Mares, Baixa do Bonfim, em
Salvador, no trabalho de catequese dos presidiários e na
formação de comunidades religiosas. Em 1966, quando o Padre
Vitalmiro o convidou para fazer um curso de diácono,
aceitou logo. E acha que "foi Deus quem iluminou o Padre".
Quando soube que o Papa iria ordenar diáconos em Bogotá,
pediu permissão para ir junto com João Gonçalves Pereira,
embora tivesse que pagar a própria passagem.

Um barbeiro em Bogotá — Em Quirinópolis, uma cidade com 13
mil habitantes, a 360 quilômetros de Goiânia, Pedro Cardoso
da Silva tem sua barbearia. Deixou-a alguns dias nas mãos
do sócio para poder ir a Bogotá ser ordenado diácono pelo
Papa. Levou sua mulher e os cinco filhos. As despesas foram
grandes, mas acha que "a graça de ser ordenado pelo Papa
compensou tudo". Como os outros três, Pedro terá quase
tôdas as responsabilidades de um padre. Os diáconos apenas
não podem oficiar a Missa, ouvir Confissões e ministrar o
Sacramento dos Enfermos.
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